terça-feira, 16 de junho de 2015

Um passeio pelas crenças: A laicidade como única garantia

É incrível o papel que a crença tem dentro da evolução humana, como ela pode evitar que levemos choques mortais, ou que pode nos forçar a dar choques mortais nos outros. Pessoas precisam acreditar em coisas, não importando quais. Por exemplo, a crença que seu time de futebol é melhor, não porque seu time seja realmente melhor, mas só porque precisa acreditar nisso.
Crença é um termo de muitos significados. Simplifico ele para ajudar na compreensão deste texto, apresentando crença como a capacidade que temos de acreditar em coisas que não vivenciamos, ou que são impossíveis de se provar a ligação concreta com a realidade. Se alguém nos diz que tocar em um fio de alta tensão nos levará a morte, não precisamos ter essa experiência para acreditar, simplesmente acreditamos. 
Isso me leva a pensar que a crença foi fundamental para o ser humano no decorrer de seu trajeto evolutivo. Lá atrás, um de nossos ancestrais dizia aos seus filhos: “Não vá aquela caverna, você morre”, e os que acreditavam, permaneciam vivos. Se ele dizia: “essa ponta de lança é boa...” dava uma vantagem brutal a quem tinha a oportunidade de acreditar nessa informação.
Sendo a crença um fenômeno manifesto em todas as comunidades humanas (assim como o homossexualismo), faço desta informação meu principal argumento pra ter segurança em dizer que esta é uma especialização filogenética, ou seja, nosso cérebro vem pronto de fábrica para a crença. Não temos a opção de não ter crença, humanos típicos, todos tem crença.
Nossa capacidade de ter crença foi crescendo junto com nosso cérebro, e de informações que serviam para a sobrevivência, começamos a desenvolver crenças sob todas as coisas que não podíamos explicar. Havia crenças sobre a razão de o sol nascer, de morrermos, de adoecermos, de sofrermos, dos terremotos, ou mesmo, de onde viemos.
Antes que eu consiga filosofar mais, chegamos à crença religiosa. Não vou dizer que todas as culturas do mundo desenvolveram religiões, não conheço todas as culturas, mas todas de que tenho notícia criaram. Em meio tantos deuses, dogmas, e mitos criacionistas, quem está certo? Acho que todos de certo modo estão certos, pois não existe razão para argumentar sobre o que não pode ser confirmado ou refutado, então, cada um tem o direito de acreditar no que lhe foi conveniente, ou mesmo não acreditar em religião alguma, preferindo acreditar na ciência, ou ne religião e nem ciência, só crer em si mesmo (“i just believe in me”).
Mesmo que a ciência tenha princípios bem mais rígidos para apresentar informações, ainda precisa de crença. Não tenho dinheiro, nem tempo, nem conhecimento para replicar todas as pesquisas que eu li, me restando apenas acreditar nas informações apresentadas pelos cientistas, e olha que eles me colocam todas as informações possíveis pra endossar as afirmações, mas mesmo assim, ainda preciso da crença.
Importante dizer que as religiões se desenvolveram de acordo com a cultura de um tempo, e tem informações que podem ou não ser muito importantes para situações sociais específicas, por isso cada povo da terra desenvolveu suas crenças religiosas, com seu próprio arcabouço teórico. Isso foi mudando por imposição violenta, e hoje boa parte do mundo ocidental se tornou cristão. Sendo honesto, não foi uma competição justa, ou você era cristão ou sofreria todo o tipo de agressão, ou mesmo a morte. Por isso restaram poucos dissidentes do cristianismo no ocidente. Eu por exemplo sou brasileiro e não sei nada sobre as crenças religiosas dos índios nativos, e de fato de fato acho que perdemos muito por não conhecer!
O que causa aflição não é o conteúdo ideológico e moral apresentado pelas religiões, mas como quem a defende o faz. Não todos, mas muitos religiosos não são tolerantes com as diferenças, transformando suas crenças em leis que são levadas muitas vezes as últimas consequências. Pessoas vem se matando à milhares de anos por muito acreditar em suas crenças. Como todos os textos sagrados do mundo não obedecem muito a uma escrita científica, sendo essas escrituras muitas vezes paradoxais e imprecisas, a interpretação das pessoas é o que torna ou não verdade algo um escrito sagrado. Logo, existem muçulmanos que acreditam que combater outras religiões é uma missão dada por Alá, e outros afirmam que isso é infame segundo o alcorão que os que combatem leram também. Do mesmo modo, uns cristãos no Brasil encontram fundamentos bíblicos para perseguir homossexuais e outros usam a mesma bíblia pra dizer que deves amar ao próximo sem distinções.
Mas se não é possível provar que determinada religião é a correta, como se pode agredir fisicamente ou psicologicamente uma pessoa com crenças diferentes? Justamente porque não há como provar a qual é a crença verdadeira. O que é mais razoável, acreditar que matar animais não-humanos agrada a entidades sobrenaturais, ou que um homem conseguiu colocar um casal de cada animal em um barco gigantesco, mesmo sabendo que existem animais hermafroditos, partenogênicos, ou mesmo numerosos demais pra caber na mais gigante das embarcações? Bote o café no fogo, e sente de modo bem confortável, porque essa conversa não terá fim!
Logo, um país que preserva sua laicidade na sua constituição, pode garantir que as religiões possam existir, e que os religiosos não vão se desrespeitar, mesmo que você acredite que seu Deus é o Macgyver. Desta forma, não podem haver leis baseadas em preceitos religiosos, não se pode forçar crianças em escolas a ler a bíblia, ou impedir homossexuais de ter uma união estável e ter filhos. Não se pode levar missas ou cultos religiosos para locais onde se precise de laicidade, como um congresso ou uma câmara de vereadores. Não se pode querer que pessoas se calem mediante crimes com fundamentação religiosa para preservar a imagem de religiões ou de religiosos. Religião não melhora as pessoas, não muda seu caráter, nem diminui a probabilidade de cometerem crimes.
Sei que muitas pessoas só encontram a paz que precisam quando encontram uma religião, e isso é muito bom, mas essa não é uma justificativa para achar que outros irão encontrar a mesma paz que o praticante da religião encontrou. Eu por exemplo não sou cristão e sou tão feliz quanto qualquer um. E mesmo não sendo cristão, vou a igrejas cristãs, frequento o círio, comemoro natal, porque dessa forma fico perto das pessoas que amo.
Finalizando, o respeito à laicidade significa saber que o outro é diferente de você no que tange a religião, mas não é seu inimigo, que não é menor ou pior, é simplesmente diferente. Toda a pessoa religiosa deve se assegurar que atos contra a laicidade cometidos dentro de sua fé não ficarão sem o correto tratamento, não importando se quem o praticou foi um parente, um padre, um sacerdote, um druidaum pastor, um pai-de-santo, um necromancer ou um estranho, o mais ético é denunciar às autoridades se esse for o caso, ou só conversar com o intolerante e o esclarecer das garantias que a laicidade traz. Fico triste ao ver praticantes religiosos defendendo o indefensável (como o caso da menina apedrejada por ser praticante do candomblé ou o adolescente morto por ser homossexual) para preservar a imagem de sua igreja. Só denunciando esses atentados podemos garantir que a crença seja sempre algo bom para a humanidade.

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